Ilustração: Dayane Reis/CRESS-MG
Mais de 500 pessoas vindas de todas as regiões do país participaram do Seminário Nacional Serviço Social, Feminismos e Diversidades Trans, que ocorreu em Belo Horizonte (MG), nos dias 3 e 4 de setembro, organizado pelo CFESS e pelo CRESS-MG.
O evento foi construído por assistentes sociais cis e trans. A mesa de abertura teve representantes do CFESS, CRESS-MG, ABEPSS, Associação Nacional de Travestis e Transsexuais (Antra), Fórum Nacional de Travestis e Transexuais Negras e Negros (Fonatrans) e Instituto Brasileiro de Transmasculinidades (Ibrat). Todo o seminário foi transmitido ao vivo pelo canal do Youtube, CFESS Vídeos, e está disponível.
A mesa “Serviço Social, Feminismos e Diversidade Trans: aliança entre teoria, história e desafios políticos frente ao conservadorismo”, Silvana Mara, assistente social e professora da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (Uern), abordou a conjuntura brasileira e os desafios frente ao conservadorismo, aliando teoria e história. “Quando olhamos para a origem da sociedade capitalista e a formação da nossa sociedade, vemos que se forma um sistema dominante que rejeita a diversidade e não a inclui como parte do seu projeto”, analisou.
Militante travesti e educadora popular, Amanda Palha destacou a inadequação de certas concepções tradicionais de gênero e sexo, que frequentemente marginalizam e invisibilizam as experiências trans. Ela descreveu a situação como um “conflito de compatibilidade”, em que os conceitos tradicionais se mostram insuficientes para abranger a complexidade das demandas de pessoas trans e travestis.
O projeto de morte que afeta a população trans, seja por meio de violência direta ou das condições sociais que levam ao suicídio, foi destaque no debate. Mayara Saraiva, assistente social e mestra em Serviço Social pela Uern, em sua fala, ressaltou a urgência de reconhecer a realidade trans como parte intrínseca da luta feminista e dos direitos humanos.
Além disso, abordou o crescente conservadorismo que alcança práticas trans-excludentes e reforça opressões ao ignorar as identidades de gênero. As palestrantes defenderam a necessidade de um feminismo que acolha todas as mulheres, independentemente de suas identidades de gênero, raça ou classe social.
O clima no seminário foi de sensibilização e de convite à ação coletiva: “Precisamos construir pontes ao invés de muros, estar juntas na luta por um feminismo que não deixe ninguém para trás”, reforçou Mayara. O público somou, trazendo importantes reflexões para o debate e a mesa.
Assista à filmagem do evento, disponível pelo canal do CFESS no YouTube!
Segundo dia: atuação profissional com as pessoas trans e travestis
Liliane Caetano, assistente social, representante do CFESS no Conselho Nacional de Promoção dos Direitos da População LGBTQIA+ 2015 a 2019, iniciou o debate do segundo e último dia na mesa “O exercício profissional de assistentes sociais com pessoas Trans nos serviços e políticas públicas”. A profissional trouxe um histórico da construção de normativas para a população trans e travesti no Brasil, bem como as legislações do Conjunto CFESS-CRESS e seus rebatimentos na atuação profissional.
“Temos uma perspectiva no ‘processo transexualizador do SUS’ com histórico de judicialização,
patologização e psiquiatrialização, longas filas para o acesso a cirurgias, além de normativas conservadoras e opressoras do Conselho Federal de Medicina. Tudo isso ainda coloca desafios primordiais para nossa atuação profissional nos equipamentos e equipes multidisciplinares”, avaliou Caetano.
Agnaldo Engel, conselheiro do CFESS, falou sobre o papel de assistentes sociais, enquanto profissionais de saúde, na luta e defesa pela despatologização da identidade trans e travesti. O assistente social, que trabalha em um Centro de Atenção Psicossocial (Caps) em Osório (RS), falou sobre a experiência com o cuidado em saúde mental das pessoas trans na região, diante da falta de acesso em saúde, preconceitos e estigmas da sociedade e das instituições. “É fundamental verificar todas as determinantes de saúde e adoecimento na questão da saúde mental, favorecendo o reconhecimento de pessoas trans enquanto cidadãs de direito”, avaliou.
A mesa contou ainda com a contribuição de Thiago Stephan, homem trans, assistente social da Secretaria Especial de Direitos Humanos de Juiz de Fora (MG). O profissional falou também sobre a experiência de atendimento à população trans e travesti na saúde do município, por meio do Programa Visitrans. “O movimento trans é o mais ativo e que tem articulado mais ações em Juiz de Fora, juntamente com a Astra - Associação de Travestis e Transexuais, e foi assim que conquistamos o atendimento no hospital universitário em nossa cidade”, afirmou Thiago.
O debate teve ainda a participação de Pâm Herrera, pessoa trans não binária e bacharel em Serviço Social, que tratou, em sua fala, sobre a importância do acolhimento no atendimento à pessoa intersexo. “É importante tratarmos deste conceito, pois estamos falando de pessoas que não se enquadram nas normas médicas e sociais para corpos femininos ou masculinos. Nesse contexto, coloca-se pra nós o desafio de combater estigmas, preconceitos, ódio e a direção de humanizar corpos e existências dissidentes”, explicou Herrera.
A última mesa de debates trouxe o tema “Feminismos e diversidade Trans: desafios para o trabalho profissional comprometido com a luta anticapitalista, antipatriarcal, antirracista, anticapacitista e transincludente”, com Rayane Noronha Oliveira, Bruna Benevides (Antra), Luciana Vasconcellos (Fonatrans/MG) e Fabian Algarte (Ibrat).
De acordo com Fabian, homem trans e coordenador do Ibrat, deu um emocionante depoimento sobre as violências que sofrem as pessoas trans na sociedade, dando exemplos de transfobias e orientando sobre práticas a serem adotadas para combater essa discriminação. “É fundamental contarmos com o apoio do Serviço Social, na perspectiva da intersetorialidade, para uma atuação profissional compromissada com o combate à discriminação contra os homens trans, cujas violências e angústias eu vivencio todos os dias”, alertou o coordenador.
Em seguida, Bruna Benevides, travesti, feminista, sargenta da Marinha e presidenta da Antra, apresentou dados reais sobre as estatísticas que envolvem as violências contra a população trans no Brasil, resultado de pesquisa coordenada por ela desde 2017. “Hoje há uma agenda antigênero, que em alguns momentos recai com maior incidência sobre pessoas trans, isso em todos os espectros políticos, por ter se tornado uma pauta que causa desconforto. Isso agrava a nossa luta pela interseccionalidade nas políticas públicas e nos espaços de controle social. Precisamos em definitivo romper com a violência, pois queremos ocupar os lugares que desejarmos”, denunciou Benevides.
Também à mesa, Rayane Noronha, assistente social e professora da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) refletiu sobre o compromisso teórico-metodológico e ético-político do Serviço Social em relação aos feminismos, dissidências sexuais e de gênero e raça. A professora pontuou a indissociabilidade da racialização do gênero, da heterossexualidade compulsória, as premissas do feminismo negro e do transfeminismo e os necessários avanços para o Serviço Social.
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