Arte: Rafael Werkema/CFESS
O CFESS acompanha com preocupação a tramitação do Projeto de Lei 1904/2024 na Câmara dos Deputados, de autoria do deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ). O projeto de lei busca modificar o Código Penal e propõe equiparar o aborto após a 22ª semana de gestação ao crime de homicídio, mesmo nos casos em que o procedimento já é garantido em lei, como ocorre nos casos de estupro.
Consideramos o referido projeto um retrocesso nos direitos assegurados desde 1940! Nesta semana, de forma antidemocrática, a Câmara dos Deputados aprovou o regime de urgência para o Projeto de Lei 1904/24, um assunto de tamanha relevância para a saúde, para a garantia de direitos da população brasileira e para a vida das mulheres! O fato é grave, pois os projetos com urgência podem ser votados diretamente no Plenário, sem passar antes pelas comissões da Câmara.
Os alarmantes dados de nosso país demonstram como tamanho retrocesso, caso o PL seja aprovado, impactará na vida de muitas meninas no Brasil que foram vítimas de violência sexual. De acordo com os dados do DataSus, divulgados pela Campanha “Criança não é mãe” (https://criancanaoemae.org/), em 2019, cerca de 72 gestações foram interrompidas legalmente em crianças e adolescentes menores de 14 anos. Em 10 anos (2013-2022), a média de nascidos vivos de meninas menores de 14 anos foi de 21.905 por ano. Ou seja, a cada ano, mais de 20 mil meninas deixaram a infância ou a adolescência para viverem a maternidade. Dessas, mais de 70% eram negras.
Conhecido como PL da Gravidez Infantil, o Projeto de Lei 1904/2024 poderá ir a plenário nos próximos dias. Efetivamente, pessoas que precisem acessar o direito ao aborto legal nos serviços públicos de saúde poderão ser condenadas a até 20 anos de prisão.
O CFESS integra a Frente Nacional contra a Criminalização das Mulheres e pela Legalização do Aborto (FNPLA). O movimento tem alertado a sociedade brasileira que, se aprovado o PL, meninas vítimas de violência serão obrigadas a seguir com a gestação, já que, em muitas situações, a gravidez é descoberta tardiamente, o que já indica a desproteção social das nossas infâncias e juventudes em uma sociedade com relações violentas e patriarcais.
Em trecho de nota divulgada nesta quarta-feira (12), a FNPLA enfatiza que “caso a lei seja aprovada, proibindo a realização de aborto legal acima de 22 semanas em caso de estupro, as principais afetadas serão as crianças, que são boa parte de quem busca os serviços de aborto com esse tempo de gravidez, uma vez que, em casos de abuso sexual, há mais demora em descobrir ou mesmo identificar a gestação. Isso tudo em um país em que, no ano de 2022, foi registrado o maior número de estupros de vulnerável da história, com 74.930 vítimas. Destas, 6 em cada 10 vítimas são crianças com idade entre 0 e 13 anos, que são vítimas de familiares e outros conhecidos. Essas crianças não podem ser forçadas a ser “mães”!
Ressaltamos a importância de que a categoria de assistentes sociais se posicione contrária a projetos que retrocedem direitos adquiridos, tendo compromisso com a proteção integral das infâncias, juventudes e com a vida das mulheres e pessoas que gestam. O projeto de lei também reforça a criminalização das vítimas e de profissionais que realizem o procedimento.
O Conselho Nacional de Saúde (CNS), órgão do qual o CFESS também faz parte, aprovou hoje (13) a Recomendação ao presidente da Câmara dos Deputados de arquivamento do PL 1904/2024. A Recomendação ad referendum nº 015/2024 sugere também a promoção do debate democrático do tema na Câmara dos Deputados, por meio de audiências públicas com a participação da sociedade civil organizada, o que não ocorreu até agora, já que a tramitação do projeto foi aprovada em caráter de urgência. Acesse aqui a Recomendação no site do CNS
Nós, assistentes sociais de luta, precisamos nos mobilizar!
Como isso afeta nosso trabalho profissional? As ações orquestradas por grupos fundamentalistas antidireitos têm atacado também os serviços de aborto legal, em que assistentes sociais estão inseridas(os)!
O CFESS participou do ato em defesa dos serviços de aborto legal no dia 16 de maio, articulado pela Frente Estadual pela Legalização do Aborto de SP. Também esteve presente, em 23 de maio em Brasília (DF), ao ato contra a resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) que proibia a realização da chamada assistolia fetal para interrupção de gravidez, procedimento usado pela medicina nos casos de abortos previstos em lei, como em estupro. Muitos são os ataques aos direitos vinculados ao aborto legal, com produção de obstáculos ao acesso ou ataque aos serviços existentes, que já tem um número insuficiente e geralmente só concentrados nas capitais, sofrendo com desfinanciamento ou fechamento.
Também lançamos, como subsídio para a atuação profissional da categoria, a nota técnica “A importância ética do trabalho de assistentes sociais nas diferentes políticas públicas para a garantia do direito à vida das mulheres e para a materialização do direito ao aborto legal” (clique aqui para acessar).
Em trecho da nota, enfatizamos que “enquanto profissão cujo Código de Ética tem como valor central a liberdade e como princípios a defesa intransigente dos direitos humanos e a recusa do arbítrio e do autoritarismo, não podemos nos eximir de prestar informações e orientações às/aos usuárias/os, assim como não nos cabe julgar as escolhas da população e/ou bloquear o acesso a direitos. Nos é vedado cercear ou bloquear o acesso a direitos. É nosso dever garantir informação, assim como respeitar as escolhas de usuárias e usuários, independentemente das nossas convicções pessoais”.
Esse é um tema para nosso cotidiano de trabalho, nos diversos espaços sócio-ocupacionais, e uma deliberação do 50º Encontro Nacional do Conjunto CFESS-CRESS: “Promover ações, em conjunto com o movimento feminista, pela descriminalização e legalização do aborto, fazendo incidências políticas para superação das barreiras de acesso ao aborto legal e debate junto a categoria, com orientações e formações sobre o tema”.
O Brasil está se mobilizando e atos ocorrerão em vários estados! Assistentes sociais também compõe essa luta! É possível acompanhar os locais onde haverá atos pelo perfil da FNPLA no Instagram: @pelavidadasmulheres
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Conselho Federal de Serviço Social (CFESS)
Gestão "Que nossas vozes ecoem vida-liberdade" (2023-2026)