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Sexta, 23 de Dezembro de 2011.

“Homofobia é crime” é o grito da 2ª Conferência LGBT
Participantes exigem a restauração do texto do PL que criminaliza a homofobia. Assistentes sociais marcam presença

Durante a fala da ministra, delegados/as exigiram ações concretas do Governo Federal (foto: Rafael Werkema)

Terminou no domingo, 18 de dezembro, em Brasília, a 2ª Conferência Nacional de Políticas Públicas e Direitos Humanos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (LGBT). A última conferência do ano foi marcada, de um lado, pela insistência do Governo Federal em afirmar que houve grandes avanços na afirmação dos direitos da população LGBT, e de outro, pela reivindicação dos/as participantes pela restauração do texto original do projeto de lei que criminaliza a homofobia e pelas denúncias de crimes homofóbicos. O CFESS marcou presença com os/as conselheiros/as Maurílio Matos e Marylucia Mesquita.

"Todos os dias, lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais são vítimas de constrangimentos, atitudes violentas e até levados a morte. Não é possível que crimes motivados pelo ódio sejam tolerados no país da diversidade", afirmou a ministra da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR), Maria do Rosário. Segundo ela, o ano de 2011 pode ser considerado "um marco da árdua e constante luta contra todos os tipos de discriminações", destacando a decisão história do Supremo Tribunal Federal (STF), que reconheceu, por unanimidade, em maio deste ano, a união estável homoafetiva.

O presidente da Associação Brasileira (ABGLT), Toni Reis, fez uma análise de avanços e retrocessos referente aos direitos da população LGBT desde a 1ª Conferência, em 2008, e ressaltou como vitória, além da decisão do STF, o Plano Nacional de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos LGBT, a Coordenação-Geral Nacional de Políticas LGBT, além de instaurado o Conselho Nacional de Combate à Discriminação e Promoção de Direitos Humanos LGBT. "Contraditoriamente, mesmo com os avanços no plano federal, observou-se ainda um acirramento da violência homofóbica e da resistência de setores conservadores e fundamentalistas religiosos contrários a qualquer tipo de afirmação dos direitos da população LGBT. É nesse contexto que a presidenta Dilma, em decisão equivocada e retrógrada, recuou em relação ao material didático-pedagógico do projeto Escola Sem Homofobia, trazendo a mensagem de que a luta LGBT deve ser feita autonomamente de governos", criticou.

Para a piauiense e militante da Liga Brasileira de Lésbicas (LBL), a advogada Marinalva Santana, a Conferência é mais uma forma de enfrentamento a todas as formas de preconceito. "Em uma conjuntura difícil de aumento da violência contra a população LGBT, nosso papel aqui é exigir ações concretas do Estado em defesa dos direitos humanos de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais. O que vemos é muita conversa e pouca atitude e está na hora desse quadro mudar", cobrou. Ela ressaltou também o papel decisivo do movimento LGBT, enfatizando que "a subserviência diante dos governos - sejam eles de quaisquer partidos ou forças políticas - devem ser varridos de nossa prática militante" e falou ainda da responsabilidade da sociedade em "levar a cabo a discussão dos temas que estão na ordem do dia, inclusive para dar o bom exemplo de uso responsável com os recursos públicos investidos nesta Conferência".


Marylucia Mesquita e Maurílio Matos, do CFESS, com o manifesto distribuído durante a Conferência (foto: Rafael Werkema)

Participantes denunciam violência e pedem ações mais concretas
Durante a Conferência, foram aprovadas propostas e moções de apoio à versão original do projeto que torna a homofobia um crime equivalente ao racismo e ao antissemitismo (perseguição a judeus). De acordo com os/as delegados/as, o substitutivo que tramita na Comissão de Direitos Humanos do Senado é genérico e não atende às demandas da população LGBT.

Outra reivindicação aprovada foi a de aumentar a articulação entre a União e os governos estaduais e municipais na promoção de políticas públicas específicas.

Em todas as mesas e painéis, participantes relataram casos de violência contra a população LGBT. "Acolhemos uma lésbica que foi estuprada durante 30 dias por traficantes que queriam 'corrigir' sua orientação sexual. E o poder público nada fez", relatou uma delegada. Um transexual masculino afirmou ter sido vítima da violência policial no Nordeste: "disseram que se eu queria ser homem, deveria apanhar como homem", denunciou. E assim, durante toda a Conferência, os/as delegados/as trouxeram histórias de violência contra a população LGBT, mostrando que a ausência de políticas públicas efetivas do Estado em relação aos direitos desta população e a falta legislação específica contribuem para o agravante quadro de violação de direitos humanos.

"Os/as assistentes sociais são reconhecidos como profissionais que atendem às pessoas que vivenciam na perversidade cotidiana da sociedade capitalista os efeitos da questão social. A discriminação e a violência são uma destas expressões e, não por acaso, as que mais atingem a população LGBT. Buscar mudar essa realidade, em articulação com movimentos sociais, órgãos de defesa dos direitos humanos, entidades da própria categoria profissional, entre outros, construindo também uma prática de combate ao preconceito e buscando viabilizar o acesso a direitos e serviços, é uma contribuição imprescindível que o/a profissional de Serviço Social pode prestar", enfatizou o conselheiro do CFESS, Maurílio Matos.

Serviço Social e direitos da população LGBT
Não faltam instrumentos teórico-político-normativos do Conjunto CFESS-CRESS em relação à defesa dos direitos da população LGBT. A começar pelo Código de Ética do/a Assistente Social, que traz princípios em defesa da liberdade, autonomia, diversidade da pessoa humana, e de luta contra a discriminação por orientação sexual, gênero, identidade de gênero e etnia etc.

Em 2006, o Conjunto CFESS-CRESS lançou a campanha nacional pela liberdade de orientação e expressão sexual "O amor fala todas as línguas: assistente social na luta contra o preconceito", em parceria com o Instituto em Defesa da Diversidade Afetivo-Sexual (DIVAS), a Liga Brasileira de Lésbicas (LBL), a Articulação Brasileira de Lésbicas (ABL) e a Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros (ABGLT), e publicou a Resolução 489/2006, que estabelece normas vedando condutas discriminatórias ou preconceituosas, por orientação e expressão sexual por pessoas do mesmo sexo, no exercício profissional do/a assistente social.

Em 2010, o CFESS adotou o "Manual de Comunicação LGBT", que serve de orientação para imprensa e sociedade trazendo termos, leis, datas e outras informações que ajudam, sobretudo, os meios de comunicação a compreenderem a realidade e as necessidades do público LGBT.

E mais recentemente, publicou a Resolução CFESS nº 615/2011, de 8 de setembro de 2011, que permite à assistente social travesti e ao/à transexual a utilização do nome social na carteira e na cédula de identidade profissional. A normativa possibilita a utilização do nome social nas assinaturas decorrentes do trabalho desenvolvido pelo/a assistente social, juntamente com o número do registro profissional.

"Entretanto, ainda tem assistente social que não apreendeu esse conteúdo e sentimos isso na pele, ao sermos atendidas em Centros de Referência Especializados de Assistência Social (CREAS)", reclama a travesti e militante LGBT paraense Symmy Larrat. Segundo ela, é preciso aprofundar o debate com a categoria sobre a diversidade e o atendimento ao/à usuário/a LGBT. "Às vezes, vemos o despreparo de alguns/as profissionais assistentes sociais, a começar pela forma de se referir ao público LGBT", afirmou.

Mas para o assistente social e professor da UERJ, Guilherme Silva de Almeida, o Serviço Social, nos últimos anos, vem aprofundando a temática LGBT, pincipalmente no que diz respeito à produção acadêmica, o que contribui muito para o exercício profissional do/a assistente social. "A inserção da nossa profissão na questão dos direitos humanos LGBT precisa estar cada vez mais qualificada", apontou.

Guilherme falou também da importância da participação dos/as assistentes sociais na Conferência que, segundo ele, aumentou em relação à primeira edição, mostrando que o Serviço Social está se apropriando sim do debate sobre a diversidade humana. "Lembro-me que na 1ª Conferência, em uma discussão que participei em um grupo de trabalho, militantes do movimento LGBT mostravam pouco entendimento sobre o Serviço Social, mais especificamente sobre a Política de Assistência Social. Alguns/as até achavam que era 'corporativismo' nosso. Aí eu questionei que se elas/as achavam que não existia pessoa LGBT em situação de rua, pessoa LGBT em situação de extrema pobreza, adolescente LGBT, idoso/a LGBT, pessoa LGBT com deficiência, o Serviço Social não seria necessário. Hoje, o cenário é outro: um maior número de assistentes sociais na Conferência e uma demanda maior de usuários/as LGBT de Serviço Social", relatou.


Reunião com assistentes sociais foi importante para discutir a questão do Cadastro Único (foto: Rafael Werkema)

CFESS se reúne com assistentes sociais
Nem a falta de espaço, nem o horário desfavorável foram capazes de desmobilizar a reunião organizada pelo CFESS com os/as assistentes sociais presentes na 2ª Conferência Nacional de Direitos Humanos de LGBT. Mais de vinte profissionais e estudantes marcaram presença no encontro, que aconteceu no horário de almoço do dia 16/12.

Os/as conselheiros/as Maurílio Matos e Marylucia Mesquita, da Comissão de Ética e Direitos Humanos do CFESS (CEDH), conversaram por mais de uma hora sobre as ações do Conjunto CFESS-CRESS em defesa dos direitos da população LGBT. Foram apresentados os posicionamentos do CFESS na defesa intransigente dos direitos humanos, da liberdade como valor ético central e do combate a todas as formas de preconceito e discriminação que se afirmam por meio da reprodução do machismo, sexismo, racismo, homofobia/lesbofobia/transfobia – ao não respeito à diversidade humana.

Segundo a coordenadora da CEDH, Marylucia Mesquita, a reunião "foi fundamental para dar visibilidade a uma área de atuação que ainda se afirma como 'marginal' no âmbito profissional, uma vez que tanto a população LGBT, bem como os/as assistentes sociais que afirmam suas identidades políticas como lésbicas, travestis, gays e transexuais, enfrentam, cotidianamente, a homofobia/lesbofobia/transfobia institucional, fruto do sistema de dominação heterosexista".  Ela fez questão de ressaltar as duas Resoluções do CFESS como subsídios importantes para a categoria e para a população LGBT no reconhecimento de seus direitos e a importância de os/as assistentes sociais divulgarem mais instrumentos e iniciativas.

Também na reunião foi discutida a questão da alteração do Cadastro Único no âmbito da Política de Assistência Social. "É um dos maiores desafios, uma vez que se trata de um instrumento que identifica e caracteriza as famílias, possibilitando conhecer sua realidade socioeconômica, trazendo informações do núcleo familiar e de cada um/a dos/as componentes da família. No entanto, a família LGBT não está visibilizada. Ora, se é com uma referência familiar heteronormativa que se trabalha, como estes/as usuários/as LGBT vão ter acesso aos seus direitos?", questionou Marylucia, afirmando que a população LGBT precisa ser reconhecida como usuária no Cadastro Único para, efetivamente, ter acesso aos programas e políticas sociais. "Por isso, é necessário que os/as assistentes sociais que atuam com esta população sistematizem suas experiências e invistam em pesquisas que permitam conhecer o perfil sócio econômico e cultural, para podermos identificar as reais necessidades e demandas desta população em quaisquer políticas, como Assistência Social, Saúde, Educação, Segurança, Habitação, dentre outras", completou.

Para Maurílio Matos, "a reunião mostrou que já há, nos diferentes cantos do Brasil, assistentes sociais que, no seu dia-a-dia, constroem uma prática profissional de combate às diferentes expressões de homofobia, lesbofobia e transfobia. Também percebemos que a reunião foi um espaço importante de articulação entre os/as profissionais, na defesa de propostas importantes nas suas áreas de ação profissional, especialmente nos campos da Previdência, da Assistência Social".


Adesivo distribuído na Conferência (ilustração: Rafael Werkema)


CFESS Manifesta, adesivo e cartaz
Também durante a reunião, o CFESS lançou, oficialmente, o manifesto "Assistentes sociais em defesa da Diversidade Humana", produzido especialmente para a 2ª Conferência. "O Conselho Federal representa, aproximadamente 110 mil assistentes sociais em todo o Brasil e atua em conjunto com 25 Conselhos Regionais na fiscalização e orientação do exercício profissional, na defesa de um projeto profissional vinculado a um projeto societário anticapitalista, não patriarcal, antirracista e não heterosexista. É com base nesse entendimento que, no âmbito de sua atuação na defesa de uma ética libertária e emancipatória e na defesa intransigente dos direitos humanos, nos empenhamos na eliminação de todas as formas de preconceito, recusa toda forma de arbítrio e autoritarismo. E dessa forma incentivamos o respeito à diversidade e à participação de grupos socialmente discriminados", afirma trecho do documento.

Um adesivo com os dizeres "Homofobia é crime. Aprovação do PLC 122 já" também foi distribuído. 

E em resposta uma demanda dos CRESS e do próprio movimento LGBT, e cumprindo uma das deliberações do eixo Ética e Direitos Humanos do 40º Encontro Nacional CFESS-CRESS, o CFESS reimprimiu também cartazes da campanha "O amor fala todas as línguas: assistente social na luta contra o preconceito", que foi distribuído para os/as participantes. O material será enviado aos CRESS e Seccionais de Base para distribuição.


Cartaz "O amor fala todas as línguas" foi reimpresso e distribuído na Conferência (foto: Rafael Werkema)

Avaliação sobre a 2ª Conferência
Para militante da Liga Brasileira de Lésbicas (LBL), Marinalva Santana, o destaque da 2ª Conferência foi para a posição firme dos/as participantes em rejeitar veementemente o substitutivo da Senadora Marta Suplicy para o PLC 122/2006.

"A 2ª Conferência afirmou que a luta pela criminalização da homofobia/lesbofobia/transfobia permanece como uma das estratégias fundamentais da agenda de tendências do movimento LGBT críticas aos acordos realizados com perspectivas fundamentalistas que negam os princípios do Estado Laico", opinou Marylucia Mesquita, da CEDH-CFESS.

Ela afirmou que ainda falta orçamento público para as políticas LGBT, sobretudo no que se refere ao funcionamento dos Centros de Referência LGBT e demais equipamentos das políticas sociais, a exemplo de CRAS e CREAS, com profissionais qualificados/as devidamente para o enfrentamento à homofobia/lesbofobia/transfobia social e institucional. "Faltam recursos para realização de pesquisas que permitam traçar um perfil sócio econômico e cultural dessa população, possibilitando alcançar suas reais necessidades e demandas nas diferentes políticas sociais". E finalizou dizendo é necessário ampliar o número de assistentes sociais na defesa dos direitos humanos LGBT. "Essa luta não diz respeito apenas ao movimento LGBT ou a quem vivencia essa forma particular de opressão, mas sim a todos/as aqueles/as que acreditam e lutam pela construção de uma sociabilidade efetivamente libertária e com emancipação humana", completou.

(com informações da SEDH, Agência Brasil e ABGLT)

Leia o CFESS Manifesta sobre a 2ª Conferência Nacional de Políticas Públicas e Direitos Humanos de LGBT"

Baixe o adesivo "Homofobia é crime. Aprovação do PLC 122 já"

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A conselheira do CFESS Marylucia Mesquita faz intervenção na mesa que discutiu Políticas Públicas e Direitos da População LGBT (foto: Rafael Werkema)


Grupo de trabalho discute propostas a serem levadas para a Plenária Final (foto: Rafael Werkema)

Conselho Federal de Serviço Social - CFESS
Gestão Tempo de Luta e Resistência – 2011/2014
Comissão de Comunicação

Rafael Werkema - JP/MG 11732
Assessor de Comunicação
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